O Serviço de Psicologia e Orientação do Colégio São Filipe, onde colaboro, tem-se debatido com as mais variadas problemáticas dos seus alunos, alinhando estratégias de despiste e intervenção nas dificuldades específicas da aprendizagem (leitura, escrita e calculo).
Segundo Luís de Miranda Correia, “as dificuldades de aprendizagem específicas dizem respeito à forma como um indivíduo processa a informação – a recebe, a integra, a retém e a exprime –, tendo em conta as suas capacidades e o conjunto das suas realizações. As dificuldades de aprendizagem específicas podem, assim, manifestar-se nas áreas da fala, da leitura, da escrita, da matemática e/ou da resolução de problemas, envolvendo défices que implicam problemas de memória, preceptivos, motores, de linguagem, de pensamento e/ou metacognitivos. Estas dificuldades, que não resultam de privações sensoriais, deficiência mental, problemas motores, défice de atenção, perturbações emocionais ou sociais, embora exista a possibilidade de estes ocorrerem em concomitância com elas, podem, ainda, alterar o modo como o indivíduo interage com o meio envolvente.” (Correia, 2008, p. 46).
É neste sentido, gostaríamos de partilhar algumas informações científicas, para que se possam desmistificar as ideias já ultrapassadas sobre alguns distúrbios, que hoje se sabem ser neurodesenvolvimentias.
Não podemos continuar a pensar que alguns alunos são apenas perguiçosos e desleixados quando, são os próprios alunos que se esforçam mais que os outros e sentem dificuldades tremendas para atingir os seus “suficientes” no final das provas de avaliação.
Hoje falaremos sobre Dislexia, Disgrafia, Disortografia e Discalculia.
As dificuldades de aprendizagem (DA) atingem uma taxa de cerca de 48% de prevalência nas necessidades educativas especiais. (NEE). Segundo a Associação Portuguesa de Pessoas com Dificuldades de Aprendizagem Específicas (APPDAE), o número de alunos com estes distúrbios tem vindo a aumentar, registando-se actualmente uma prevalência de 5% a 10% da população total de alunos.
É então extremamente importante que quem está envolvido com os alunos diagnosticados com Dislexia, Disgrafia, Disortografia e/ou Discalculia esteja preparado para compreender as suas características e responder às suas necessidades específicas. Só assim poderá promover a criação de contextos educativos e pedagógicos individualizados, que estimulem o desenvolvimento pessoal e social, a aprendizagem e o sucesso escolar e profissional.
A Dislexia
Definição: etimologicamente, dislexia deriva dos conceitos “dis” (desvio) + “lexia” (leitura,
reconhecimento das palavras). “É caracterizada por dificuldades na correção e/ou fluência na leitura de palavras e por baixa competência leitora e ortográfica. Estas dificuldades resultam tipicamente de um défice na componente fonológica da linguagem que é frequentemente imprevisto em relação a outras capacidades cognitivas e às condições educativas. Secundariamente podem surgir dificuldades de compreensão leitora, experiência de leitura reduzida que podem impedir o desenvolvimento do vocabulário e dos conhecimentos gerais.” (Associação Internacional de Dislexia, 2003, cit. por Teles, 2009).
Fonseca (1999, cit. por Moura, 2011) acrescenta tratar-se de uma “dificuldade duradoura” que surge em “crianças inteligentes, escolarizadas, sem qualquer perturbação sensorial e psíquica já existente.”
Independentemente do quociente de inteligência do luno (QI), a dislexia é de origem neurobiológica e afeta a aprendizagem e utilização instrumental da leitura, resultando de problemas ao nível da consciência fonológica.
A Disgrafia
Definição: etimologicamente, disgrafia deriva dos conceitos “dis” (desvio) + “grafia” (escrita), ou seja, é “uma perturbação de tipo funcional que afeta a qualidade da escrita do sujeito, no que se refere ao seu traçado ou à grafia.” (Torres & Fernández, 2001, p. 127); prende-se com a “codificação escrita (…), com problemas de execução gráfica e de escrita das palavras” (Cruz, 2009, p. 180).
A criança com disgrafia apresenta uma escrita desviante em relação à norma/padrão, isto é, uma “caligrafia deficiente, com letras pouco diferenciadas, mal elaboradas e mal proporcionadas” (A.P.P.D.A.E., 2011b); a chamada “letra feia”.
A Disortografia
Definição: etimologicamente, disortografia deriva dos conceitos “dis” (desvio) + “orto” (correto) + “grafia” (escrita), ou seja, é uma dificuldade manifestada por “um conjunto de erros da escrita que afetam a palavra, mas não o seu traçado ou grafia” (Vidal, 1989, cit. por Torres & Fernández, 2001, p. 76), pois uma criança disortográfica não é, forçosamente, disgráfica.
“Perturbação que afeta as aptidões da escrita e que se traduz por dificuldades persistentes e recorrentes na capacidade da criança em compor textos escritos. As dificuldades centram-se na organização, estruturação e composição de textos escritos; a construção frásica é pobre e geralmente curta, observa-se a presença de múltiplos erros ortográficos e [por vezes] má qualidade gráfica.” (Pereira, 2009, p. 9).
Discalculia
Definição: etimologicamente, discalculia deriva dos conceitos “dis” (desvio) + “calculare” (calcular, contar), ou seja, é “um distúrbio de aprendizagem que interfere negativamente com as competências de matemática de alunos que, noutros aspetos, são normais.” (Rebelo, 1998a, p. 230). Assim, trata-se de “uma desordem neurológica específica que afeta a habilidade de uma pessoa compreender e manipular números.” (Filho, 2007).
Indicadores estatísticos dizem-nos que a maior parte dos alunos revela problemas na aprendizagem na disciplina de matemática. Os alunos não compreendem os enunciados dos problemas, outros demoram muito tempo a perceber se precisam de somar/dividir/multiplicar e alguns não conseguem concluir uma operação aparentemente simples.
Conclusão
Estes disturbios são mais vulgares do que se imagina e importa realçar que estas crianças podem precisar de apoio reforçado em momentos muito precisos do seu percurso escolar, tornando-se indispensável que os agentes da educação que as acompanham no seu percurso escolar, reúnam as ferramentas necessárias para fazerem a diferença. Não obstante, englobamos nos agentes da eduação os pais/educadores que muitas vezes procuram fechar os olhos às dificuldades muito específicas dos seus educandos, procrastinando um diagnóstico e dificultando o trabalho de reeducação para a leitura, escrita e calculo destes alunos que se deparam perante as suas frustrações diariamente.
Estejamos todos atentos e trabalhemos no mesmo sentido.
Ver Original em: https://saofilipe.pt/dificuldades-de-aprendizagem/
Referências bibliográficas
ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE PESSOAS COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICAS (2011b). Disgrafia. https://www.appdae.net/disgrafia.html
COELHO, D. T. (2013) Dislexia, Disgrafia, Disortografia e Discalculia, https://www.ciec-uminho.org/documentos/ebooks/2307/pdfs/8%20Inf%C3%A2ncia%20e%20Inclus%C3%A3o/Dislexia.pdf
CORREIA, L. M. (2008). Dificuldades de Aprendizagem Específicas – Contributos para uma definição portuguesa. Coleção Impacto Educacional. Porto: Porto Editora.
CRUZ, V. (2009). Dificuldades de Aprendizagem Específicas. Lisboa: LIDEL – Edições Técnicas, Lda.
FILHO, C. R. C. (2007) https://www.webartigos.com/artigos/jogos-matem-aacute-ticos-para-estimula-ccedil-atilde-o-da-intelig-ecirc-ncia-nos-dist-uacute-rbios-de-discalculia/2067/#ixzz1JnDUXM53
MOURA, O. (2011). Portal da Dislexia. https://www.dislexia-pt.com
PEREIRA, R. S. (2009). Dislexia e Disortografia – Programa de Intervenção e Reeducação (vol. I e II). Montijo: You!Books.
REBELO, J. A. (1998a). Dificuldades de Aprendizagem em Matemática: as suas relações com problemas emocionais. Coimbra: Revista Portuguesa de Pedagogia, 2, 227-249.
TELES, P. (2009). Dislexia: Método Fonomímico – Abecedário e Silabário. Lisboa: Distema
TORRES, L. & FERNÁNDEZ, P. (2001). Dislexia, Disortografia e Disgrafia. Amadora: Mc-Graw-Hill
Publicado em Internas, Serviço de Psicologia e Orientação